Assumi o desafio este dias de transmitir aos alunos como se faz uma narrativa, porém, fiquei pensando em como dar conta dele. Percebi que
talvez, o modo mais interesse, apesar de sempre ser arriscado, seria realizar
uma narrativa...
Pois
bem, estou cá pensando em como trabalhar esta tarefa e tentando iniciar o
escrito. Buenas, me veio na cabeça: vou começar com o que não é uma narrativa e
depois vejo por onde sigo.
Então,
dando início, a narrativa não é um escrito descritivo sobre o que fizeram/viram
nas visitas e na experiência de propor um projeto. A descrição diz de algo
frio, que alimenta os cérebros com informações, mas que, no fim das contas, se
acaba por perdê-las em uma das gavetas de arquivo dos giros e sulcos cerebrais.
Walter Benjamin já problematizava em sua época sobre a diferença entre
informação e narrativa, com a primeira mais situada naquilo que os jornais
estampavam em suas edições, com as descrições e direcionamentos interpretativos
que apareciam nas notícias, algo rápido, coeso, que apenas dava uma informação-norte,
sem muito espaço para questões e para uma flutuação do pensamento. Walter
Banjamin gostava de flutuar, ou melhor, de flanar pelas cidades de maneira
vagarosa, vagabunda, sem compromisso ou norte planejado, para assim se
surpreender com as pequenas coisas que via na cidade muito acelerada para
reparar em alguma coisa que não no fluxo contínuo do capital. Ele preferia
tomar carona com as tartarugas ao invés das carroças/carruagens movidas pelos
cavalos docilizados para correr por Paris, ou pelos carros e metros recém
nascidos da época.
Neste
caso, podemos pensar que a narrativa é da ordem deste flutuar pelas
intensidades que vão se corporificando em nós quando habitamos e nos
encontramos com um outro, um outro pessoa, um outro animal, um outro serviço, um
outro lugar, um outro coletivo, etc. O que estes tantos outros trazem de
bagagem para habitar em nós com suas diferenças? O que essa habitação de um outro
em nós nos incomoda, como se fosse uma pedra no sapato? O que nos chama a
atenção quando nos deparamos com o inesperado que o corpo de outro nos provoca?
Creio que poder partir destas perguntas para escrever uma narrativa possa ser
interessante.
Agora,
fiquem atentos, pode ser estratégico iniciar uma narrativa com as perguntas
acima ou com algo parecido, porém, nem pense que as questões devem ser
respondidas, nada disso! As interrogações são como a utopia, não servem para
seguirmos um norte almejado, elas apenas servem para que nossos pés e
pensamentos continuem a andar, a flutuar...
Um
texto narrativo, então, pode ter interrogações, mas não levemos elas muito a
sério no sentido de respondê-las. As perguntas servirão só para aguçar nosso
pensar sobre o campo interventivo que experienciamos. Depois disso, é ir
narrando uma estória miraculosa sobre os movimentos, encontros, acontecimentos,
saltos, alegrias, tristezas e frustrações que possam ter vindo à tona a partir
da experiência de cada um na visita de um serviço. E a narrativa pode contar
uma sequência de encontros/fatos ocorridos no decorrer das visitas que
realizaram, como também pode ser feita a partir de um simples ocorrido, um
quase nada, uma distração nos encontros que tiveram e que chamou a atenção,
dando envergadura para os pensamentos andarem e para os dedos digitarem um
escrito reflexivo.
Portanto,
a narrativa, diferente da informação, não pretende ser um norte, uma receita,
mas uma possibilidade de abrir reflexões frente a uma determinada situação. A
narrativa é um suspirar, a informação é o respiro.